tila Souza Ferreira, 35 anos, foi abandonado no lixo com poucos dias de vida, em Vitria, capital do Esprito Santo. cruzeirense fantico.
Wanderlcio Alves da Silva, tambm de 35 anos, foi encontrado ainda beb numa feira ao ar livre, em Belo Horizonte. atleticano. “Desde que eu nasci”, vibra.
Ainda bebs, foram resgatados por famlias que os adotaram e os criaram. O fim da infncia dos dois, porm, veio acompanhada de mais abandono.
“Um policial militar me pegou para criar. Quando eu tinha 12 anos, ele me expulsou de casa, porque falei que eu era homossexual”, relembra tila, que chegou a voltar para a famlia que o acolhera, mas por pouco tempo.
tila Souza e Wanderlcio Alves foram abandonados quando ainda eram bebs (Foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
A histria de Wanderlcio, ou apenas “Wander”, como chamado pelos amigos, no muito diferente: “Fui encontrado na feira de chuchu, no sacolo. Meu pai e minha me me adotaram. Quando eu tinha 11 anos, minha me morreu, e meu pai me mandou embora de casa. Vim morar na rua”.
Tempos mais tarde, quando os dois tinham 22 anos, essas histrias to parecidas se encontrariam, como num roteiro de filme. Nas ruas de BH - onde vivem atualmente, em umabarracaque dividem -, superaram o frio, a chuva, a fome, o desemprego. E aram a viver um amor improvvel, reaquecido s vsperas do clssico pela Copa do Brasil.
tila e Wanderlcio simbolizam amor e tolerncia antes de Cruzeiro x Atltico h3v3r
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“Vai ser 2 a 1 para o Galo da Massa. Depois de quinta-feira, vou te dar um ombro para chorar (risos)”, brinca Wander. “Para, para, para. O Cruzeiro vai ganhar de 4 a 2”, rebate tila, num dos vrios momentos de demonstrao de afeto entre os dois.
Histria de amor e luta 3c5iy
O ano 2006. Wander caminhava pela Avenida Dom Pedro II, nas proximidades do Bairro Bonfim, Regio Noroeste de Belo Horizonte. Carregava com ele pacotes de salgadinho e pipoca, alm de um isopor com gua mineral - produtos que vendia para sobreviver. Enquanto recebia o pagamento de um cliente, um olhar lhe chamou a ateno.
“Num olhar, a gente pegou e comeou a conversar. Ele estava indo para uma direo, e eu estava numa esquina. O olhar dele se desviou e veio at mim. Olhou, focou, gostou, acabou. Pronto. E at agora, at hoje. Tivemos idas e vindas, sempre, mas toda ida e vinda foi bem edificante”, conta, sorridente, tila, ao olhar para o namorado.
“Ns resolvemos colar um com o outro para podermos levantar, n">Os dois adotaram quatro cachorros nas ruas de Belo Horizonte (Foto: Renan Damasceno/EM/D.A Press)
“Um ns achamos no lixo, o outro achei tambm no lixo h quatro anos, este ns ganhamos de uma dona. Este aqui a dona ia jogar no Rio Arrudas, mas ele (tila) pegou da mo dela”, diz Wander.
o amor pelos “filhos” que os mantm nas ruas. “No existe abrigo que tem cachorro. No existe. Eu falo que so meus filhos. Mas no tem abrigo que aceita eles. Se no aceitam, eu tambm no vou”, avisa tila.
Enquanto isso, continuam pelas ruas de BH. Wander trabalha com venda de materiais reciclveis. tila ainda no conseguiu um emprego formal desde que, h quase um ano, deixou o restaurante em que trabalhava.
Cachorros so tratados como filhos pelo casal (Foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Segundo o Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada (IPEA), o Brasil tinha 101.854 pessoas em situao de rua em 2015. O nmero cresce a medida em que aumenta a taxa de desemprego, que atingiu 12,5% no trimestre de fevereiro a abril.
tila e Wander buscam empregos formais para, eventualmente, alugarem uma casa. Nas ruas, enfrentam o frio do inverno da capital mineira e a chuva: " o pior de tudo", diz o atleticano.
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tila e Wanderlcio se encontraram na rua, quando tinham 22 anos (Foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Dados compilados pela ONG Grupo Gay da Bahia apontam que o Brasil registrou 420 mortes motivadas por LGBTfobia em 2018 - uma a cada 20 horas. De janeiro at maio de 2019, foram 141 casos, tambm de acordo com a organizao.
No ambiente do futebol, casos de LGBTfobia so frequentes e naturalizados. No ltimo dia 2, torcedores entoaram o grito de“bicha” no Mineirosempre que o goleiro Armani, da Argentina, cobrava um tiro de meta na derrota por 2 a 0 para o Brasil, na semifinal da Copa Amrica.
Em junho, o ms do orgulho LGBT, diversos clubes de futebol do pas no se pronunciaram, embora se posicionem em outras causas sociais. Atltico e Cruzeiro tambm se calaram. Entre torcedores das duas principais equipes de Minas Gerais, frequente o uso de cnticos ou gritos homofbicos e machistas como tentativa de menosprezar os rivais.
Em meio a esse ambiente hostil, tila e Wander surgem como smbolos de resistncia e amor, embora no se posicionem dessa forma. O cruzeirense conta que, apesar de todos os problemas, respeitado nas ruas pelos amigos.
“O povo aqui gosta de ns. O povo aqui sabe que ns somos um casal “diferente” [aponta para as camisas, para deixar claro que est falando dos clubes, no da orientao sexual]. Somos homossexuais e nos respeitam. No tenho que ser atleticano ou ele ser cruzeirense ou palmeirense, torcer para o mesmo time. O que manda o amor”.
E na quinta-feira? 6o5h64
Na quinta-feira, Cruzeiro e Atltico comeam a definir uma das vagas nas semifinais da Copa do Brasil (Foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
Embora o futebol seja uma paixo em comum, a rivalidade no foi um assunto que dominou as primeiras conversas do casal. “Comeou com ele me fazendo raiva, ouvindo o jogo no celular. Ele me zoava demais”, diz tila.
“, porque a eu descobri que era cruzeirense. At ento eu no sabia que era cruzeirense. Ficava caladinho. Depois que descobri que era cruzeirense, acabou (risos). Agora que vou zoar mesmo!”, responde Wander.
O clima para o jogo desta quinta-feira j de provocao e ansiedade. “E que no e disso”, alerta tila. “No para se levar a srio e querer matar o outro. Jogo esporte. Cad o amor? Esfriou. O povo est extrapolando j”, completa.
“Jogo uma bobagem, uma diverso. No aquela coisa de: ‘Ah, ele cruzeirense, eu odeio ele, vou matar ele’. No tem nada a ver no. Isso bobagem de torcedor. No pode ser assim”, refora Wander.
Juntos, os dois vo assistir ao jogo entre Atltico e Cruzeiro nesta quinta-feira, a partir das 20h. As equipes se enfrentam pela partida de ida das quartas-de-final da Copa do Brasil, no Mineiro. O duelo de volta ser na prxima quarta-feira, s 19h15, no Independncia.
Como ajudar 6g4l69
tila e Wander, assim como outras pessoas em situao de rua, receberam ajuda do Cruzeiro Social. “ um projeto de voluntrios, um coletivo em que a gente est buscando e est conseguindo engajamento de vrias pessoas de segmentos da sociedade para ajudar diversas iniciativas”, explica o empresrio Christiano Rocco.
O grupo auxilia pessoas com agasalhos e comida, alm de realizar outros projetos de cunho social.
Quer ajudar">Clique aqui para ar a pgina do Cruzeiro Social no Facebooke contate os envolvidos no projeto.